Olho pela sacada da varanda superior da casa...silêncio da noite...casas com poucas luzes acesas.Valença adormece.Parece sono de bebê,com hora certa...Pra mim, essa é a hora do sono de beber...e ter sonhos etílicos.Mas, estou sóbria e, sobriedades à parte,a madugada vem abrindo suas portas, sem pedir licença.
É a hora de ler Clarice...como foi,um dia,a hora de Clarice ler com mais clarividência, a angústia que dá ver as luzes se apagando...Nisso, consiste a grandeza da noite na cidade pequena,ela mesma,inteira,um abajur com fraca luz de lamparinas,feito, mesmo, moradia na roça...
Saudades de minha Copacabana,luz acesa toda a madrugada...Notívaga e urbana, mantenho minha caixa de lembranças fechada.Preciso dessa saudade boêmia de ver as coisas,de "ressentí-las" dentro de mim.
O Rio de Janeiro continua lindo, mas Chacrinha não continua balançando a pança...E a minha Valença, abandonada feito um barco à deriva,balança a sua magra pança, pra lá e pra cá,guerreira,lutando pra não afundar ou morrer a fome do abandono.
Preciso não dormir,não fechar os olhos.Preciso dessa angústia pra manter a chama da lamparina, que pode ajudar a encontrar a saída, numa rua sem saída.
A hora é grande,é zero e os ponteiros, juntos, anunciam, feito flechas, que é chegada a hora de bater os tambores e chamar todas as tribos dessa cidade dos Coroados, para a dança raivosa, ao redor da fogueira...
Deixo ferver meu sangue de bisavó antepassada, que foi pega a laço e habitou esse mesmo lugar que hoje piso...É quase que uma incorporação,um êxtase,um delírio...Faço fumaça,pinto o corpo para a guerra e aguardo,com olhos abertos, a hora certa do ataque surpresa aos podres poderes, que ainda teimam em colonizar,catequisar e dizimar a minha tribo...
Noite de Primavera,15/10/2010 - Jô.
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